segunda-feira, 18 de março de 2013

.:O Brincar:.





Uma nova concepção sobre o papel do brincar
 
Houve um tempo em que era extremamente nítida a separação entre o brincar e o aprender. Os momentos de uma atividade e de outra eram separados por um grande abismo e não se concebia que era possível aprender quando se brincava.

Mais tarde, essa idéia foi lentamente sendo substituída por outra, que preconizava que existiam "brincadeiras apenas lúdicas" cuja finalidade era somente animar, alegrar e distrair, e outras, que poderiam ensinar um ou outro conceito e desenvolver esta ou aquela habilidade. A maior parte das pessoas adultas, distantes dos novos estudos sobre a mente humana e a maneira como ela opera o conhecimento e constrói convicções, ainda pensa de uma ou de outra maneira. Para elas, o brincar sempre se distancia do aprender ou não apenas há nítida separação entre brincar e aprender, como é natural que deva existir brinquedos que alegrem e divirtam e outros que eduquem.

Essas idéias foram literalmente superadas por tudo o que hoje se conhece sobre a mente infantil, e não há mais dúvidas de que é no ato de brincar que a criança se apropria da realidade imediata, atribuindo-lhe significado. Em outras palavras, jamais se brinca sem aprender e, caso se insista em uma separação, esta é a de organizar o que se busca ensinar, adequando o ensino com brincadeiras para que melhor se aprenda.

Brincando, a criança desenvolve a imaginação, fundamenta afetos, explora habilidades e, na medida em que assume múltiplos papéis, fecunda competências cognitivas e interativas. Como se isso tudo já não fizesse do "ato de brincar" o momento maior da vida infantil e de sua adequação aos seus desafios, é brincando que a criança elabora conflitos e ansiedades, demonstrando ativamente sofrimentos e angústias que não sabe como explicitar. A brincadeira bem conduzida estimula a memória, exalta sensações emocionais, desenvolve a linguagem interior — e, às vezes, a exterior —, exercita níveis diferenciados de atenção e explora com extrema criatividade diversos estados de motivação. Ora, a aprendizagem e a construção de significados pelo cérebro se manifesta quando este transforma sensações em percepções e estas em conhecimentos, mas esse trânsito somente se completa de forma eficaz quando aciona os elementos essenciais proporcionados pelo bom brincar, que são memória, emoção, linguagem, atenção, criatividade e motivação.
Em suas brincadeiras, as crianças constroem seus próprios mundos e deles fazem o vínculo essencial para compreender o mundo adulto, dão novos significados e reelaboram acontecimentos que estruturam seus esquemas de vivências, sua variedade de pensamentos e a gama diversificada de sentimentos que têm. Toda criança que se encontra distanciada da criação desse "mundo" se afasta da significação do "outro mundo" em que, como adulto, buscará decifrar e estabelecer linhas de convivência. É com triste frequência que se descobre que, em muitos desajustes apresentados por adultos, ancora-se a ausência ou distância do devaneio tão marcante no "faz de conta", com o qual se arquiteta o mundo infantil. Não é, pois, sem razão que a brincadeira representa o sólido eixo da proposta educativa de uma boa escola de Educação Infantil.

Mas não nos iludamos.
Aos pais importa bem menos que a escola tenha brinquedos e que os exiba e bem mais a  maneira como os utiliza e de que forma esse uso realmente estrutura a proposta educativa.
Brinquedos caros e professores despreparados constituem uma equação que agride os fundamentos da aprendizagem e "atiram pela escada abaixo" todos os estudos e progressos sobre a arte de brincar e o desafio de aprender. Uma escola ou creche em uma favela, por exemplo, pode não dispor dos coloridos e atraentes brinquedos eletrônicos presentes em outras, mas, com sucata e criatividade, com mestres verdadeiros e pesquisadores interessados, pode desenvolver estímulos que nada ficam devendo aos propiciados pelos brinquedos caros em mãos competentes. Brincar favorece a autoestima, a interação com seus pares e, sobretudo, a linguagem interrogativa, propiciando situações de aprendizagem que desafiam seus conhecimentos estabelecidos, fazendo destes elementos para novos esquemas de cognição. Por meio do jogo simbólico, a criança aprende a agir e desenvolve autonomia, que possibilita descobertas e estimula a exploração, a experiência e a criatividade.

Celso Antunes

fonte:http://www.educacional.com.br/articulistas/celso_bd.asp?codtexto=462



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